E com os olhos cheios da água ela me respondeu:
- A vó vai mandar sacrificar ele. Ele não come mais, só chora e me dói vê-lo nesta situação. Tentei tudo o que foi preciso, mas não tem mais recurso...
Há 17 anos este cachorro tem sido companhia diária da minha vó. Mistura de pinscher com pequinês, ele foi um dos cachorros mais feios que já conheci. Com olhos saltados, rabo de porco e pelo estranho, durante muitos anos o Nique foi motivo de piada e chacota pela sua aparência horrorosa. Uma vez, numa confraternização de vizinhos na praia, todo mundo começou a rir da cara do cachorro que estava com a vó. Lembro dos olhos dele mais arregalados ainda, sem entender nada, como se estivesse chorando pedindo para o pessoal parar. Parece que ele entendia o que estava se passando e me deu muita pena.
Porém, minha vó o amava mesmo assim e acabamos nos acostumando do jeito que ele era. Sabe aquela pessoa muito feia, mas simpática? A simpatia é tanta que você nem liga mais para a aparência, e foi exatamente assim que aconteceu com este cachorro. Nos acostumamos com a sua aparência física e passamos admirá-lo por tanto amor e dedicação com a minha vó. Ele não desgrudava dela e, quando ela saia, ele entrava no guarda-roupa e ficava cheirando o sapato até ela voltar (e ai de quem tentasse tirá-lo dali, rs).
É muito triste dizer adeus ao animal que ama. Só não é mais dolorido que enterrar um pai, mãe, filho, irmão ou outra pessoa querida. Mesmo assim ainda dói na alma e deixa um espaço vazio em casa. Não sei se minha vó ainda terá saúde para cuidar de outro cachorro por tanto tempo, mas se eu pudesse fazê-lo compreender minhas palavras, queria dizer: Obrigado por cuidar tão bem da minha vó, e desculpa pelas piadas imaturas onde a aparência falava mais alto que o caráter. Você foi um bom cachorro... vá em paz, Nique!
(Obs: foto do texto ilustrativa)