O que trago nesta postagem, aos meus poucos e fiéis amigos visitantes deste espaço, é uma matéria da jornalista Kamila Almeida do jornal Zero Hora de Porto Alegre (RS). Ela fez uma reportagem especial sobre "Ausências que o trânsito deixou" publicada dia 14 de novembro de 2010. Assim que vi a capa do jornal tive muita vontade de ler, mas não sou assinante do jornal e não tive como. Depois de algum tempo, achei a matéria no portal ClicRBS.
Ao ler a reportagem com o depoimento dos pais, meus olhos estavam cheio de lágrimas e meu nariz não parava de escorrer. Cena típica de todo ser humano que se emociona com perdas familiares e se sensibiliza ao ver tantas famílias incompletas por uma fatalidade. Vou parar de comentar senão vou chorar de novo. No próximo parágrafo, vocês passam a ler a matéria na íntegra da Kamila com um link super especial do audiovisual dos pais. Reserve um tempo para ler e boa leitura!
Kamila Almeida
kamila.almeida@zerohora.com.br
A cada cinco horas, uma família é dilacerada pela notícia da morte brutal em acidentes no trânsito gaúcho. Histórias particulares se condensam em estatísticas, como as 1.405 vidas ceifadas de janeiro a outubro deste ano, segundo o Departamento Estadual de Trânsito (Detran).
Do total, 359 não chegaram aos 30 anos de idade — e 259 ficaram entre os 18 e 24 anos. Atordoados diante da lógica invertida, casais que perderam filhos eternizam a última lembrança de seus tesouros: o quarto.
O colorido impregnado no dormitório juvenil contrasta com o caminho acinzentado que os pais passaram a percorrer. As flores, a luz da vela e os adornos típicos de quem, aos 18 anos, ainda tateava no mundo adulto são os itens visíveis do quarto de Alessandra Andreolla Feijó, filha do empresário e vice-governador Paulo Afonso Feijó, 52 anos, e da professora de educação física Lisette, 49 anos.
— Nos primeiros seis meses eu dormia aqui, vez por outra. A sensação é de que, no quarto, estamos mais perto. Era o cantinho dela — conta Lisette.
Luanda Patrícia, filha dos empresários Eliane, 37 anos, e Roque Redante, 43 anos, de Guaporé, também tinha 18 anos quando partiu. O dormitório rosado ficou intacto. Num bloco, Luanda deixou rabiscados 45 desejos que ela calculava alcançar antes dos 35 anos. Cumpriu, pelas suas anotações, apenas três: "dançar em cima de um palco loucamente", "dormir com a roupa que saiu" e "viajar com as amigas".
Em Flores da Cunha, a empresária Noeli Agostinetto, 38 anos, mãe de Willian, 19 anos, quis fazer diferente. Logo após a morte do adolescente, tentou se desfazer de tudo, mas já na primeira doação, o coração apertou. Ela e o marido, Cladecir, 44 anos, acabaram vencidos, e as recordações de azul até hoje predominam nos 11 metros quadrados do cômodo incólume.
Ezequiel foi fruto da oitava tentativa de Marta Maria Pretto de engravidar. Quinze anos depois, com a morte do marido, o garoto virou a família de Marta. Mais três anos se passaram e o filho, de 28 anos, se foi, lançado contra a traseira de um caminhão.
— Eu sinto o cheiro dele. Tem vezes que é mais forte. Acho que depende de mim, de como estou — confidencia a mãe.
Quando a garganta da costureira Maria de Lourdes Webber Raupp, 59 anos, engasga, ela solta um berro, para dor da vizinhança. Dia desses, na pequena Dom Pedro de Alcântara, no Litoral Norte, gritou de saudade das traquinagens de Gabriel, 22 anos. O som, estridente, ecoou a ponto de despertar solidariedade. Ela recusou e explicou:
— Deixa eu gritar. Preciso aliviar o peito.
Na casa de Odete da Luz, 53 anos, e do marido, Edemar Rossetto, 57 anos, no município de Novo Barreiro, até a extensão do telefone é mantida no quarto de Everton, morto aos 29 anos, cuja despedida paralisou a vida do casal, há nove meses, até na arrumação da casa.
— Ele dizia que a cortina da sala incomodava. Sempre a prendia em um vaso de flores. Foi o que fez pela última vez antes de sair na tarde do acidente. Desde então, não consegui mais soltar a cortina — conta a mãe.
Os jovens tombados nessa guerra urbana deixam planos incompletos. Mariana ainda cultivava desejos infantis, aos 11 anos, quando partiu, forçando Nara e Clóvis Rodrigues a zelar por ursos de pelúcia, Barbies, roupas e sapatos da menina, intocados desde a ausência da filha única.
As histórias se cruzam e se repetem. Pais e mães carregam consigo objetos de valor inestimável. Noeli usa a corrente e o crucifixo de Willian, e o pai, um anel do garoto. Lisette adotou a gargantilha preta com pingente dourado em forma de coração, mimo de Alessandra. Eliane não desgruda da aliança que Luanda usava no dia da partida.
A dor das famílias amplia a sensação de impotência. Sonham em mudar o cenário dessa guerra que leva para o túmulo jovens que não se alistaram. No especial, as imagens retratam sete histórias paradas no tempo.
Clique na figura para ver fotos e ouvir os depoimentos:
Manifestações de internautas sobre a matéria
Nome: José Antonio de Souza - Bagé, RS
A vida nos junta a estes depoimentos. Hoje, são 14 anos, completados no último dia 02 de novembro. Eu e Lúcia perdemos dois filhos, Régis e Douglas com 18 e 19 anos respectivamente. Dói hoje como foi receber a notícia. A lembrança é diária pois o que mais existe é jovem na vida de todos nós. Filho é insubstituível sim. Por mais que a gente se esforço a lembrança e a saudade continua sendo insuportável. Até hoje não abrimos o armário deles pois sabemos que iremos chorar muito, ta tudo lá.
Nome: Andiara - Morro Redondo, RS
Parabéns pela matéria, perdi meu irmão no dia 29 de agosto desse ano, e ainda parece q estamos em choque, que não é verdade, e o quarto dele tbm continua lá exatamente como ele o deixou, ele tinha 24 anos, os dois amigos deles tbm morreram,um de 24 anos tbm e o outro com 16 anos.E muito triste nos identificamos muito com essas famílias.
Nome: Luiz Carlos - Santa Cruz do Sul, RS
Puxa vida. Li a matéria e me emocionei. Emocionei até demais. Que coisa, porque precisa ser assim? Gente jovem, que transmitia alegria, formavam uma familia feliz, partem de uma hora para outra e, de uma forma dramática. Que tudo que está escrito na Biblia seja verdadeiro e, que possamos nos encontrar num dia. Desejo força aos país.
Nota do blogueiro: Se por ventura o Google trouxer alguém para ler esta postagem, que enfrenta o mesmo problema dos familiares na matéria, deixo aqui um vídeo de esperança e força para continuar adiante nesta vida passageira. Não é fácil... mas é preciso tentar.
"Quando se perde alguém parece que se perde a paz..."